REFOGADINHO
Seo
Liboro aprumava no eito do lombo a sacada de semente, logo ali rente ao paiol à
carroça recebia a sementeira desnivelando as molas do batente pelo peso da
trenheira amontoada, tudo ia ser levado inté a grota. Lá ao longe, um beiral de
terra roxa descampado e limpo, puxava aparecimento no meio do verde da mata e
chamava a atenção de quem da sede da fazenda, indicasse a vista pros rumo da
serra.
Lá
em baixo Juvêncio respirava aliviado buscando o fresco da sombra do ingazeiro
depois da grande labuta do preparo da terra, tinha terminado o corte com o
arado, guiar arado é trem duro, mas quando puxado pelo Batuta era de menor
moléstia, afinal Batuta é cavalo graúdo criado no remexido da lida, com
tenência de trabalho firme e certeza de
empreita resolvida. Lá ao longe o sol começava a esquentar a terra, o batido
puxou a sede dizendo que já era hora de molhar o beiço com a água fresca do carote
de barro.
As
matracas apoiada a sombra esperavam a sementeira chegar, no topete da serra um
rebanho de nuvens enegrecidas em reboliço, embolavam se malcriando em treita da
natureza para molhar a terra, era mês de plantio do milho, e já estávamos era
bestando no atraso dos finalmente, pois São Pedro já pousava a mão nas
torneiras do céu.
A
passarinhada parecendo ter recebido recado, chegava a terra remexida aos
montueiro, fazendo um regaço nos
pequenos insetos que tentavam encontrar o rumo da sua morada misturada pelo
trabalho rasquento do fio cortante do arado que embolou toda a terra, as
rolinhas caldo-de-feijão andavam enfileiradas como fazendo forma de num ter
escapatória pros pobre coitados, que desatinados eram engolidos a fole.
Enquanto
isso a carroça descambava mundo abaixo com a sementeira, e para resenhar com o
tempo, tirei o fumo contorcido do bornal e tosei a palha com o canivete:
_
Eita trem navalhento , tão amolado que dá inté gastura.
Sem
desatino de tempo, piquei o dito na palma da mão calejada pelo serviço puxado
que executei com o companheiro, e ali sentado em um restolho de lenha, fui
afinando a paia para moldar o palheiro, enquanto isso com a ponta da botina
desenhava uns trem sem sentido na terra, Juvêncio do meu lado aproveitava a
beira de sombra para contar um causo destrambelhado de uma porcada que fazia
morada em uma furna lá nos cafundó da serra, e que tinha um tar de Copora que
era mandador deles.
De
certo ele estava falando do Caipora, mas num dei muita prosa, Juvêncio gostava
de uma inventação de trem e de um engrandecimento de assunto que não tinha
medida, se caísse um gota, pra ele era uma inundação, então disfarcei e mudei
de assunto perguntando:
_Será
que a chuva vai demorar ?
Ele
olhou para o céu, tirou o velho chapéu da cabeça e ficou num hum, hum que deu
inté gastura.
Mas
o meu intuito besta de cabra astuto na treita, me dizia que era certo dessa
porcada e de outros trem beirar a roça assim que o milho embonecar, ou mesmo
antes, quando o sereno fica pesado e força o pendão, o cheiro se descamba mata
adentro dando opinião de que o cumer ta no ponto, e nessa hora bicho entra
feito broca em madeira sem tutano, nem apruma que esperador aguarda no breu da
sombra da noite empoleirado no mutá com a porveira em ponto de tiro.
_Que
demora descabida dessa carroça!
Remoeu
Juvêncio tragando o palheiro e cuspindo no rumo do cachorro Bolota, que graniu
desconfiado e mudou o ponto da deitada, bolota era mestre na corrida do tatu
verdadeiro, o bicho cavador passava acocho no faro apurado do ranzinza vira
latas, cachorro pequeno, criado ao ermo do beiral da casa com pouco trato, e que o nome Bolota contradizia a aparência,
pois era magro de mostrar o costelado por completo a ponto de se poder contar
os ossos.
Finalmente
a carroça encostou Juvêncio com a cara amarrada, logo raiou com Seo Liboro:
_Home
que demoreiro danado.
O
veio nem assuntou, desceu fazendo beiço, mas logo ajuntamos a homaiada pra mó
de descarregar os sacos de semente, e sem avexamento, logo a matraca cheia de
semente estava pronta para iniciar o plantio, num solavanco ela abria a cova e
amoitava a semente o breu da terra, logo a agua da chuva estaria se desmanchando pela serra e germinando o milharal
que ia render comer para as criações, uma boa pamonha, cuscuz, broa, mio assado
e outros trem mais...Como dizia Dona Maria, é tudo de bom esses trem da roça.
E
ainda mais, renderia umas caçada pra mó da gente colocar a porveira para
conversar.
La
pras entranhas da mata um bando de macaco prego como que comemorando alguma
coisa gritava em desatino numa puladeira sem fim, ou comemoravam a mudança do
tempo para o cair da chuva ou o plantio do milho , no meu pensamento um remoído
de ideias me dizia é que eles sentiam
que logo teria treitisse para
roubar milho verde e correr por entre as
arvores sumindo na escuridão da mata, com um monte de espiga amarrada uma nas
outras penduradas no fio do lombo.
Passamos
o dia nessa labuta, e só acabamos quando o sol marcou ponto de fim de tarde no
alto da serra, recolhemos as ferramentas e nos amontoamos na carroça, e
devagarinho subimos pela rustica estrada
curventa. Fomos chegar à sede já no escurinho da boca da noite, lá de fora dava
para sentir o cheiro da comida caipira preparada na lenha pela prendada Dona
Maria, inté Bolota graniu animado com a esperança de alguma sobra ir parar na
sua goela.
Seo
Liboro deu a Juvêncio a tarefa de banhar e soltar o Batuta, assear as ferramentas
e guardar a carroça no galpão, isso era o prazo da gente banhar e se vestir
para a janta, a mesa ajeitada dava gosto, estava colorida de comida da roça era
de dar enchente na boca, ai foi um desatino de comilança que inté deu pesadelo.
A
noite findava num esgoelar de galo descabido, dando noticia que o sol já
bolinava o horizonte, o dia nascia passado e sem cor, o céu carregado de nuvens
roxeadas anunciava estripulia, lá no beiral do curral uma trupe de pica-pau do
campo tagarelava em gritos estridentes dando recado que o véu preto da
tempestade despencava do céu.
As águas finalmente chegaram.
Seo
Liboro que estava na lida do leite, inda deixou para traz umas três vaca sem
ordenhar, fazendo incompleta a medida do queijo, tive inté que diminuir a
medida do coalho, e ir atrás de uma forma menor, butucando o armário da cozinha.
Quando
chegou no alpendre estava agoniado dizendo que o mundo ia desabar, foi o prazo
de colocar o carote no tabuado e os pingo bateram no beiral do telhado em um
poc, poc desenfreado e sem o mínimo sentido de cadencia, o vento lambeu
arrochado as mangueiras que espalharam folhas e petico de flor para todo lado,
e no restolho voltou no rumo da gente fazendo tremer o telhado da casa toda.
Dona
Maria veio avexada com uma paia de mio seca amarrada em forma de cruz, em meio
a uma reza baixa e repetida, caminhava pela casa fazendo benzemento, tudo pra
mó de acalmar São Pedro no aprumo da tempestade, do fogão de lenha rancou de um
tição em lavareda curta onde acendeu cada ponta da cruz e colocou na beira da
soleira da porta, e ali ficou ainda um bom prazo em treita de benzesão.
Lá
fora a ventania fazia uma estripulia desatinada, o canavial dobrava de um lado
para o outro, as arvores sacolejavam infestando o terreiro de folha seca, lá no
pasto da frente o velho carvoeiro foi ao chão não suportando as chicotadas que
provinham da ventania que descia serra pegando força no paredão de pedra, do
bambuzal saia umas rajadas de vento em forma de redemoinho, Seo Liboro logo descrençou
na benzeção, dizendo que agora, o Saci, nego de uma só perna tinha sido liberto
da gomeira grossa bem do olho do bambuzal.
É
tempestade de dia inteiro cheia de malinação de Saci, dizia ele, ajeitando o pito no canto da boca com uma
cara de assustado de dar agonia, seus olhos esbugalhados fitavam do telhado ao
beiral da porta, enquanto a mão tremula tentava acender a binga para enfumaçar
o beiço.
E
eu ali no meio daquele furdunço, quietei, procurei ficar a beira do fogão de
lenha e enquanto a águada lavava o mundo eu fiz foi buscar um café quente e uma
tora de queijo coalho, e ainda aproveitei o carote de leite para clarear a cor
do café na velha xicara branca de asa quebrada, e, enquanto eu molhava o bucho
a tempestade continuava batendo sem dó, e parecia mais enfurecida a cada momento.
Pensei
na semente do milho acomodada na terra roxa de boca aberta esperando essa águada
cair para começar a germinação, e ainda fui mais longe, bem mais que a grota
que os catetos faziam morada e que o Capora como dizia Juvêncio morava com eles,
mas fui para o outro lado da serra onde o bando de queixada passa todo ano,
muitas vezes vindo pras bandas de cá.
Foi
quando levei o assunto puxando uma prosa com Seo Liboro.
_Será
que esse ano eles por motivo da roça vão beirar a fazenda?
_Eles
quem?....Home.
_Os
porcão, os quexo branco, os queixadas Seo Liboro.
_Capaz....Respondeu
ele e voltou o olhar para o batente calculando a força da chuva e reacendendo o
pito.
Nisso
o trem começou a ficar tão pesado que senti inte um tico de medo, chopp, chopp batia a porta do paiol que ficou por meia
aberta, uma saravaiada de pedra caia junto com uma metraiada de pingo grosso
embranquecendo tudo, e nisso foi inté quase na hora do comer, Seo Liboro
encanfifado dizia:
_Nunca
ví águada forte assim aqui nesses rumo, mas isso é bom sinar, é sinar que vai
ter inverno farturoso, de capim de folha larguenta e talo irrigado de grosso, é
sinar que vai ter cria sem perda é fartura pros vivente.
Devagar
a chuva foi dando uma trégua inté que cessou, o sol saiu desconfiado, fazendo a
passarinhada quentar o bico, num cantureiro retado, inicio das águas é
felicidade pra bicharada, tudo vai se refazer, tem comida em fartura, é tempo
de namoração, é tempo da brota do campo, da roça de milho, dos porcão de queixo
branco na boca da porveira, mas nessa hora me veio no pensamento....
Será
que eles vêm mesmo?
Uma
foiarada doida tomou conta do terreiro, e algumas telhas do galpão voaram
longe, as cocar piavam desconfiadas ainda no meio do canavial onde malocaram em
busca de proteção, ficaram ali por um bom tempo com medo de sair, os porco
gritava no chiqueiro, todos sentiam que era chegada as águas.
Lá
da porta da cozinha Dona Maria, com uma mão na cadeira e outra com o pano de
pia torcido, dava o anuncio.
_Gente
vem muçar, o cumer ta pronto.
Já
se passara uma semana e o milharal já deu indicio de formato, e em pouco tempo
o trem pegou corpo, a garoa fina diária geralmente no fim da tarde fez o verde
dar presença por toda a paisagem.
Com
pouco prazo o milharal desatinou o corpo e as espigas apareceram, já começava a
embonecar, foi quando pousou a noticia enviada por Zé Firmino, morador do pé da
serra de que os porcão passaram por lá dando perda no mandiocal, vara pra mais
de 180 porco, e que tava no rumo das bandas de cá.
O
varal tava baixo de carne no descansar do sol, tudo no jeito de passar um bom
prazo na carne de queixada frita na banha de porco e condicionada na lata,
ficamos feito pinto no lixo, numa alegria doida era por mais que preciso a gente estar de
preparo pra chegada dos bicho.
Seo
Liboro enviou recado pra Tonho outro morador a fim de ter a certeza do rumo dos
bicho, não custou muito chegou o confirmado de que a vara de queixada tinha
realmente passado para o lado de cá da serra e que vinha cortando as brenhas e
as macegas no rumo da gente.
O
cercado da roça podia inté parar uma cotia, que mesmo assim arranjava passagem
por entre a espinha de peixe, cerca de madeira enfileirada, no mais, Juvêncio
já tinha remendado pra mais de vez os tropelo da sapateira que teimava em
farrear no suor alheio, inda mais agora que embonecou, é para ficar em cima
senão capaz de nem colher nada.
Os
macacos estavam dando volta, sempre com um no atributo de olheiro, ficava no
pau mais alto e pronto para dar alarme no surgimento de gente enquanto o bando
fazia a festa nas pequenas espigas de doce sabor, papagaio, periquito, de tudo apareceu, nenhum
bicho ajuda na lida da roça, mas depois do trem cheirando, começa a safadeza,
tudo que é vivente quer tirar uma beira e encher o bucho.
Agora
era preparar um giral alto no meio do milharal para manter a guarda e uns mutá
nas possíveis entradas, de certo pelo baixio do terreno tem dois pontos certo
da chegada deles e é por lá que o trem tem que se aprumar, pela noticia enviada
era o prazo de 2 a 3 dias para a porcada chegar.
Rente
ao baixio da grota, caminho certo da bicharada ajeitei meu giral, em ponto bom,
giral firme e erado com motivo de poder me revirar sem afobação, podendo ter aprumo
de tiro pra toda banda, como estava de porveira tinha que esperar eles passar,
escolher os últimos e colocar no ponto certo o popoco pra mó de num perder a
carga, e depois carregar o mais rápido possível para pegar eles na volta.
Enquanto
isso Seo Liboro esperava no meio da roça no Taboado levantado para essa função,
e Juvêncio ficaria na entrada da roça.
Tinha
chegado um veranico e sol estava de rachar, e isso foi bom pois secaram as
folhas, de forma que de longe a buia ia ser ouvida, mas tem base, quem num ia
ouvir mais de 100 porco andando junto na mata, mas isso ajudou o clima ficou
melhor para passar a noite no poleiro, sem o risco de moiar o lombo o palheiro
e a porvora.
Dona Maria retirou das latas a banha e a carne
de mateiro para ajeitar uma boa farofa, o pequeno Devanir ia levar a água e o comer, enquanto
isso íamos nos reversando na esperada, e a cada dia a noticia aproximava a vara
de queixadas do nosso terreiro.
_Será
que eles vem com o tar de Copora. Exclamou
Laudelino, o vaqueiro da fazenda vizinha.
Diz
que essa tar de Copora anda amotado num porco e que comanda a vara de queixada
no rumo dos malfazer, tem dote de bruxaria e faz os porco ficar invisíver, some
nos oio da gente, e reaparece já longe do ponto de tiro, e ai fica o esperador
com cara de tacho sem ter explicação do ocorrido.
Mas
retrucou Seo Liboro....
_Isso
é crendice do povo home, existe Capora nada.
E
com a cara emburrada Laudelino resmungou que não era crença e teve o apoio de
Juvêncio, e por fim só pra contrariar a gente, deixou bem claro que não
acreditava que a porcada tinha passado para as bandas de cá da serra.
_Eles
num vem pressas banda não compadre, são firmados pras bandas de lá, isso sim é
converseiro do povo.
Seo
Liboro nem assuntou, pois sabia que Laudelino era um prosa ruim que nada
entendia da lida da mata, o que ele sabia era encher o pandeiro de pinga e
ficar perturbando a muié.
_Apruma
não home, pega o rumo que já beira o fim
da clareza do sol, logo embrenha a noite e oce fica em desvantagem da gata lhe
emboscar na estrada.
Atinou
essas falas porque estava doido para se ver livre do prosa ruim, afinal sempre
tem um sabe tudo a dar com a colher no assunto alheio, sempre cheio da razão e
na maioria dos casos cheio de bestagem de gente sem saber.
No
outro dia cedo a conversa foi mais afinada, Getúlio trouxe a noticia que a
porcada tinha entrado na fazenda, foi ai que um reboliço em desatinado que
tomou conta de tudo e num ranger de dente estava todo mundo pronto pra descer
para roça.
O
bornal no ombro do Seo Liboro estava cheio de cartucho de metal, todos
carregados com destreza e fechado com cera de abelha europa, na mão a calibre
20 de cano emparelhado trem mais linda desse mundo, a bicha com o papo todo
desenhado e escrito no cano Sarasqueta, estava afinada e ia fazer bonito no
encontro com os porcão.
Com
pouco prazo estávamos todos a postos, foi quando a mata gemeu, a buia rompeu
tripudiando meu ouvido e estremecendo a mata, o chão remexeu no ritmar das cascada dos porco
num piseiro sem fim, e o tchac, tchac da batida do queixo silenciou os outros
barulhos da mata, inté a passarinhada fechou o bico, do giral a vista bestou ao
ver a visagem do verde ao longe se
empretecer com o movimento da porcada chegando.
O
estrondo da buia mostrando que a cada momento a porcada estava mais perto, me
fez perder o prumo, desnivelou minha respiração, e o coração danou em um descompasso,
era um baticum avexado e sem medida, a orelha da porveira estava armada e a
espoleta no ponto de tiro, encaixada no apoio orelha, fiquei imóvel, os olhos
nem piscava, e aquela maloca sem fim foi passando por baixo do giral no rumo da
roça.
Queixada
é trem valente, e viaja longe, se uma vara dessas pegar um cabra no chão o
sujeito corre é perigo de vida, vem em riba e ataca mesmo, e pense num dente
amuado de fino que é cortante feito faca de coureiro.
Voltando
ao assunto eu tinha que controlar a afobação, olhei para o topo da arvore
procurando o céu, respirei fundo, fechei um pouco os olhos, tinha que esperar
até que um bocado da porcada passasse no buraco da cerca, que ia ser café
pequeno pois o cercado de pau amontoado um no outro que o povo chama de espinha
de peixe é frágil, ai quando eles ganhassem a roça, ai era minha vez, era cantar a porveira
escolhendo um dos retardatário do fileiro da maloca, ai daria tempo para mais uma ou duas recarga.
Meu
medo era a bestagem de Juvêncio, que num desatino podia atirar por antes da
hora e por a perder o desembaraço da Sarasqueta do Seo Liboro, que pela
vivencia da lida e pela quantidade de cartucho estava certo de fazer um regaço
de porco pregado de chumbo no meio do milharal.
O
milho estava no ponto de pamonha, verdinho e macio, lá do meu giral a mais de
200 metros da roça eu sentia o cheirinho, o mesmo cheiro que enlouquecia a
porcada. E vem porco de todo lado, e tá que passa porco, parecia que o trem num
ia acabar nunca.
Juvêncio
para minha surpresa se aprumou, segurando a espingarda junto ao peito e olhando
para cima, pausando o respiramento a fim de não causar dano maior a empreitada,
foi quando a porcada achou a entrada da cerca e invadiram o milharal.
Ai
a conversa foi outra, logo surtiu da boca da Sarasqueta de Seo Liboro um teu,
teu cadenciado que era quebrado somente
pela pausa de se destrambelhar o cano e trocar os cartucho, um bocado de porco que
ainda tinham ficado de fora logo levaram um lapada da Soca-soca do Juvêncio, um
pooooooof abafado dava noticia de tiro certeiro, foi quando embaixo do giral
uns dez a doze porco parou na indecisão do ia ou vinha, foi quando escolhi uma
fêmona ajeitada e descansei na cruzeta dela aprumando o rumo da massa de mira e
acionei a orelha que pousou pesado da espoleta fazendo a porveira destrinchar a
coluna da desavisada numa só lapada, ai foi um desatino.
Tentando
acalmar a agonia meti pólvora pra dentro do cano na medida, soquei a bucha,
coloquei o chumbo e outra bucha socando a ponto certo, nesse meio tempo o
reboliço era medonho, e tinha confusão para todo lado, quando pousei a espoleta
e levantei a orelha, um bocado dos retardatário passou batendo o queixo,
escolhi mais um e pooooooof, dessa vez como tava mais longe coloquei na
longarina da tabua do pescoço, e foi tão certeiro que o porcão caiu sem nem
mesmo bater pezinho.
Danei
a preparar outra carga, nesse impasse a tremedeira era medonha, e perdi a
medida de pólvora branca tendo que recomeçar o recarrego pra mais de vez, nessa
hora parece que a mente foge e a matutisse domina a gente, de forma a agir numa
agonia que inté faz o cabra entrar na pendência do rumo.
Nesse
intervalo Seo Liboro já tinha papócado seus oito cartucho, e o mocorongo do Juvêncio
ainda tentava fazer a segunda carga, e porco já tinha derribado a cerca e
sumido no mundo a muito tempo, ficou apenas alguns que fraqueado no extinto
ainda pelejava encontrar o rumo que a vara tinha tomado.
No
giral o cheiro da porvora branca ainda fazia presença, e mais a frente o lesado
do Juvêncio finalmente tinha recarregado a porveira dele, e mirava ela pra todo
lado procurando motivo de vivente em movimento para liberar a orelha na espoleta
que estava na espera, nesse meio tempo de longe percebi que Seo Liboro já tinha
descido do trepeiro e estava sangrando os porcos que tombou.
Então
para acompanhar o movimento, desci também do giral, puxei e sangrei os dois
queixada que eu tinha derribado, Juvêncio pegou um, e Seo Liboro sete, foi um
regaço de dez porco, agora era subir pegar a carroça e descer para levar os
bicho pro trato, era dia inteiro de serviço, e carne para uma boa temporada.
Dessa
vez quem estrebuchou o beiço puxando a carroça foi o Batuta, amontoamos a
porcaida e depois de tudo no jeito Seo Liboro colheu dois sacos de milho verde,
e embarcou na carroça, subimos a serra com o sorriso colado na orelha, mesmo
sabendo que tinha serviço para mais de dia, tanto no conserto da cerca como no
preparo de conservação da carne.
Como
era muito peso tinha que ser levado em várias viagens, que ficou a cargo de Juvêncio,
e Batuta de orelha murcha parecia não gostar nada do que estava carregando na
carroça, sem falar no peso, teria que queimar gordura nessa empreita,
Na
casa fomos pendurando no caibro da varanda beirando o alpendre de acordo com
que ia chegando, todos os porcos, um por um com focinho no rumo do chão, nesse
meio tempo levei os sacos de milho pra dentro da cozinha onde Dona Maria
preparava um café com biscoitinho de queijo, e pra num perder a viagem roubei
um dois e sai queimando a mão e soprando feito louco.
La
fora Juvêncio descamisava a porcada, desfatando e separando a carnes em tipos,
duma fêmea ainda nova Seo Liboro tirou o lombo e a costelada, levando para
cozinha para ser preparada para o almoço, uns seis pernil traseiro foram
abertos, salgados e tocados ao sol dentro da tela do secador de carne, outros
foram picados para fazer linguiça, enquanto dois enormes tachos pousados no
velho fogão de lenha aquentava a gordura de porco para fritar o restante e
enlatar, eita trem bom é carne de lata, inda mais de queixada.
A
labuta pegou grande parte do dia, e quando a buchada colava no espinhaço o
cheiro da comida tomou conta da varanda, e o grito estridente de Dona Maria nos
fez parar o serviço.
_Hora
de almoçar meu povo, vem que ta tudo pronto...
Na
mesa, arroz branco, farofa, costelado de queixada e REFOGADINHO de milho
verde....kkkk........
Eita
vidinha mais ou menos..kkkkk
Bello 07/06/2014
FRENTE A FRENTE
COM A RAINHA, OU MELHOR O REI DA FLORESTA
O sol ainda estava forte quando parei o jipe no alto da
serra, era inicio das chuvas e lá no horizonte algumas nuvens em tom de cinza
me dizia que essa noite ia ter água na espera, mas como sou cobra criada já
tinha me antecipado a isso, capa e telhado (um nylon camo impermeável com
medida de 1.60x3m com tiras para amarrar acima da rede) na mochila junto com a traia, minha garrafa
de café, lanche, lanterna e tudo mais.
Iniciei a descida da grota, rumo ao pequizeiro que
beirava a orla da mata, lugar que por longos 3 anos me deram grandes
felicidades, adorava esperar ali, a paisagem era maravilhosamente esplêndida,
no fundo da grota uma grande cachoeira que a noite colocava a boca no mundo,
com o seu chuaaaaaaaaa, bem baixinho ecoando na mata.
Logo em frente um paredão de pedras que ultrapassa os 100
metros de altura, era moradia das araras Canindé que faziam farra todo fim de
tarde como que dizendo: Chegamos em casa...E a festa ia longe atiçando a renca
de Cancão que gritavam feito loucos, junto com o bando de jacus que resmungavam
no fundo do grotão pulando nos largos galhos da centenária gameleira.
O cerrado ia acabando e dando lugar a mata fechada e nesse
intervalo se encontrava um par de pequizeiro que eu fiz de ponto de espera,
cevando sempre, ponto que me trouxe muitas alegrias, e que guardo com carinho a
visões que ali pude contemplar.
O chão tava fuçado, os porcos passaram no dia anterior,
mas ainda tinha trato, era sinal de que voltariam no fim da tarde, amarrei a
traia e armei a balestra uma Vision da Horton, a segunda reversa que passava
pela minha coleção, subi, ajeitei a rede, sentei e puxei a traia, fui
distribuindo os trem e organizando o trepeiro, no quiver ( local onde se leva
as flechas ), escolhi a flecha com ponta ideal pra tal labuta, uma Slick Trick
de quatro laminas , encaixei na Vision e pendurei a bruta ao alcance da mão, do
meu lado a pistola Browning Buckmaster
com 10 CCI stinger no carregador, tudo
já destravado, pois já batia quatro da tarde e a qualquer hora o bando de
catetos podia entrar.
Lá embaixo os bichos se aquietaram e uma jaó voou
assustada ecoando o som do seu bater de
assas.....Prooooooooooooooooooooooo.....E se fez um silencio diferente, logo
pelo lado direito um trem veio chegando devagar remexendo nas folhas, fiquei
imaginando ser um catingueiro, pelas passadas lentas e cadenciadas, mas de
repente o trem gritou e caiu na corrida, era uma cotia, estranhei a reação
dela, mas imaginei, os porcos tão chegando...Isso já era umas 4:30 da tarde,e se fez silencio geral na
mata...Esperei atento e nada....
Abri minha garrafa de café servi uma boa golada no copo,
tomei e me aconcheguei na rede, nesse momento algumas juritis bagunçavam
andando de um lado para o outro batendo sua cantoria e tentando um rápida
copulada, bem relaxado puxei um cigarrinho e meti fogo, nessa posição eu
contemplava o verde das arvores sem poder ver o chão, e ali longe do mundo me
coloquei a pensar enquanto fumava..
De repente as juritis voaram desesperadas num bater de
assas barulhento, levantei o corpo devagar, pois algo havia chegado, quando
meus olhos tocaram o chão, meu coração disparou, era umas cinco e meia da
tarde, o sol ainda se fazia forte, e a menos de seis metros de mim estava a
rainha da floresta, linda com seu olhar amarelo, linda, perfeita.
Quando me levantei, meu olhar já se bateu com o dela, ela
tinha me visto bem antes que eu pudesse vê-la ou sentir sua chegada, que só
percebi pelo disparate das juritis, seu olhar era de curiosidade e eu
sinceramente senti um misto de surpresa, adrenalina e felicidade...
Olhei para a balestra, mas já estava com a Browning na
mão, e mirei no rumo da gata, e mesmo assim a rainha da floresta manteve sua
pose, aquele olhar amarelo invadiu minha alma, e como quem dizia: Já matei
minha curiosidade.... Virou de lado e saiu a caminhar lentamente, vez enquando
olhando para ver se eu ainda estava ali na rede a contemplar sua beleza,
abaixei a pistola e recoloquei no lugar, fitei a sua perfeita camuflagem
amarela e preta sumir mata adentro em passos silenciosos...
Tenho 43 anos de idade e com 30 dias de nascido já estava
visitando a fazenda levado no colo pela
minha amada mãe, durante toda minha vida me embreei nas matas, acometido por
uma paixão que me sufoca, que me consome, a qual eu não entendo a origem nem o
sentido, mas que leva sentido a minha vida, tanto tempo dedicado trilhando todo
Centro Oeste, Mato Grosso, e outros cantos mais, uma inquietação que me faz
dependente das matas, do barulho das águas que correm nos rios, do cantar dos
pássaros, foram muitos anos de andanças para um dia poder olhar cara a cara a
rainha da floresta, em estado selvagem.
Porque
iria alvejá-la, tiraria do meu filho o direito de um dia também poder ter tão
maravilhosa experiência?
Não
podia fazer isso, naquele momento meus pensamentos foram longe, o sol começou a
se esconder no seio dos montes, e na mata o silencio reinou, como diziam os
antigos nem grilo cantou naquela noite, somente o barulho da cachoeira se fazia
presente ao longe, quando as sete e quarenta da noite ela esturrou já lá no
fundo da grota, como quem dizia.. Ainda estou aqui
E
foi-se assim até as nove, quando a dona lua começou a pintar de prata a noite
escura do inicio de outubro, ai ajeitei as traias, desci do pequizeiro e pequei
o trieiro subindo a grota, eu estava sozinho, mas sabia que o respeito pairou
no nosso encontro e aquele macho já marcava aquele território a muito tempo,
pois sempre escutava seus esturros ao longe, em minhas noitadas de espera.
Eu
estava feliz, por ter tido a oportunidade de poder ver, de sentir seu cheiro,
de poder entrar nos seus olhos, eu estava feliz pela minha atitude, eu estava
feliz por saber que ali anda tinha espreitando pelas brechas da mata densa a tão perseguida e temida onça pintada.
Chegando
ao Jipe pude olhar lá de cima todo vale em matas e locais de acesso quase
impossível para um homem, mas uma verdadeira casa com varanda para a Rainha da
Floresta, ou bem melhor...Para o Rei da Floresta.
Bello
25/08/12
Putz, bela historia, já passei por uma situação assim tbm, simplesmente inexplicavel, BÃO D+.
ResponderEliminarLinda história meu amigo, parabéns.
ResponderEliminarCumpadi Bello, esta é a diferença entre um caçador de verdade, ético e amante da natureza, aquele que se importa com o que deixar para os seus filhos e netos verem, e um caçador de meia pataca que só pensa em troféus e é incapaz de se controlar, resistindo ao desejo de aparecer para os seus colegas como o "grande bwana branco". Parabéns! Tem o meu reconhecimento!
ResponderEliminarMeu finado avô já dizia, se tirar a vida da mata, só restará tristeza, é bom demais ver a vida em movimento..
EliminarQue refogatinho bom... causos assim me faz lembrar do meu sertão. É uma emoção igual a de quando berra a porveira. Qtas saudades meu irmão!!!
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