SINA DE MATEIRO
Fazer
o que?
Se
é assim que meu coração sacoleja na caixa do meu peito, se é na lida que ele me
faz feliz, se é no cheiro do mato que me sinto vivo, se é no som da corredeira
do rio que eu respiro, se é no pio cansado e saudoso da Jaó que aperto minha
magoa, se é na voo retilíneo do casal de Canindé que corta o azul do céu que eu
viajo.......
Fazer
o que? Se essa é minha sina....Ser mateiro...
Não existe nada melhor nesse mundão de meu Deus do que estar
na companhia da bicharada, na lida diária da fazenda a natureza me fascinava e
me surpreendia do nascer ao pôr do sol, sempre algo novo acontecia, ora era uma
jiboia lidando no galinheiro, ora um tucano fazendo a festa na goiabeira, ou um
Mucura cortando o terreiro fugindo do meu cachorro americano com o lombo
repleto de fiote agrudado. O arrebol avermelhado pincelava todo o céu nos
confins da serra, cada dia tinha uma pintura diferente que o Pai Maior fazia
para demonstrar que estava ali, cuidando da gente.
Tudo
era contagiante, desde que me entendo por gente já carregava o estilingue pendurado
no pescoço e a capanga com pedras escolhidas uma a uma na beira do ribeirão
pendurada no ombro, negacear as Rolinhas era quase minha vida, ai o trem foi
tomando outra toada, as Inhambu foram meu próximo passo, ai vieram as Codorniz,
as Perdizes, as Jaó. O trem se aprumava aos poucos, a cada dia eu aprendia
mais, e a fome de estar na mata era tão constante que parecia não ter fim.
Lá
no céu a dona lua vinha prateando tudo, fazia o contorno dos buritis se
tornarem reconhecível mesmo na madrugada, o brilho refletido na lagoa, o cantar
do sapo, o cri cri do grilo, o piado agudo da coruja, a noite viva me fazia
perder o sono imaginando o que estaria dando vida aos trieiro da mata, o que
andaria nos campos, Dona Onça onde estaria essa hora, e assim eu sonhava com
minhas caçadas, com a mata e com tudo que vivia ali.
O mais difícil era ter que me engomar todinho depois do
almoço para ir ao Grupo, isso mesmo, Grupo era como a gente chamava escola
naquela época, papai levava a gente de carro de boi inté a estrada principal,
onde o carro passava catando a molecada, Dona Conceição era a professora e o
maior trabalho que ela tinha era passar o dia raiando comigo para prestar
atenção na aula e largar de olhar para o lado de fora pela janela.
Lá
fora um casal de construtor da floresta, o João de Barro e sua esposa, faziam a
labutada empreita de construir seu ninho, casinha de barro que mais parece um
forno de roça, era um vai e vem sem fim da biqueira da torneira trabalhando o
barro com o biquinho até o pé de Ipê onde se instalava a nova moradia, cada dia
eu via que a natureza falava.
No pasto ao longe um bando de Curicacas trabalhavam juntas
caminhando em linha catando tudo que é inseto que desse bobeira, eita que a natureza
é uma baita professora, basta olhar e aprender, tudo isso me chamava a atenção,
mas dona Conceição teimava em me lavar para a sala de aula a todo instante, com
um monte de números no quadro parecia falar Grego, o que menos eu gostava era
essa tal da matemática, o trem complicado.
A vida é um trem desaprumado e difícil de se entender,
talvez por esse trem não ter entendimento mesmo, no fim eu acho que a vida
acabou sendo feita foi para ser vivida, cada um fazendo o que gosta mas de
forma a respeitar o mundo e o próximo, dessa forma todos seriamos felizes e
nada mais, tentar entender a vida seria arrogância demais para um matuto feito
eu que nunca tive muito interesse na lida da letra, no mais eu sou um cabra por
demais modesto e deixo essa labuta pro povo mais letrado.
E
o tempo ia rompendo a estrada da vida, devagar as coisas iam tomando destino,
papai e mamãe labutavam sem parar, lida de roça é pra quem tem tutano, gente
mole logo afina, eram dois grandes guerreiros de fibra e coragem, ambos estavam
preocupados com nosso futuro, queriam uma vida melhor pra gente e faziam
planos, logo tínhamos que ir para cidade para continuar os estudos, o sonho de
mamãe sempre foi nos ver letrados, para que assim pudéssemos ter uma lida menos
labutenta, fio Doutor era seu sonho.
Eu tinha meus afazeres que me tomava toda a manhã, acordava
sempre cedo com o raiar do sol, quando o galo cantava eu já estava de rosto
lavado na beira do fogão esperando o café, cuidava de tudo que é criação
pequena, porcos, patos, galinhas, coelhos, codornas, o gado e a lida leiteira
era de papai, eu ainda juntava os ovos, molhava a horta e cuidava dos capim e
ervas que teimavam e nascer em meio aos legumes dos canteiros, juntava a lenha
e não deixava fazer falta na beira do fogão de mamãe. ainda apartava os galos
briguentos e essa trenheirada ia até as 11:00 quando mamãe gritava do
alpendre..
_Vem almoçar..O comer tá pronto...
Era a melhor hora do dia, a cheirinho da fumaça misturado
com o tempero maravilhoso de mamãe nunca vão sair da minha mente, e era assim o
meu dia, correndo de um lado para o outro ao som do cantar dos Pássaro Preto,
que traquinava no pomar, com o estilingue na mão ia pajeando as Gralhas que
estavam sempre em busca de ovos para furar, mas o que eu mais queria naquele momento
era furar a escola e ir andar na mata com a porveira do papai na mão, pegar a
trilha da porcada e voltar com um queixo branco nas costas no tardar do dia.
Na minha imaginação o gavião também não escaparia da minha
mira, o galho seco da gameleira que ele costumava sentar curiando os pintinhos
ia ficar órfão de suas garras malvadas desinteradeira de família, colocaria ele
no saco dando paz ao terreiro por um certo tempo inté aparecer outro tirano
para continuar a eterna luta, tudo aquilo ali era meu mundo, meu reino, minha
vida, ali eu me sentia o garoto mais feliz do mundo, e queria a todo custo que
nunca fosse diferente, tinha o ribeirão e a cachoeira com sua água cristalina e
geladinha, tinha a palhada onde trilhava as inhambu com seu andar rápido balançando
a cabeça, tinha a Medalha a nossa vaca malhada que era o xodó de papai, a
Buzina que berrava sem parar e outras coisas mais que faziam da fazenda o
melhor e mais bonito lugar desse universo.
Logo depois do almoço tudo isso se desfazia quando mamãe
começava a apressar a gente com o horário da escola, meu irmão caçula o Lucas, era
mais desprendido, não ligava muito pros trem da roça, vivia sempre lendo,
evitava a lida, e sempre vinha com uma história esquisita de uns povo que iam
mudar o mundo, uns tal de idealista.
Mas
nada mais me importava, no fim de semana minha preocupação era cuidar da minha
obrigação e correr para a lida mateira, cada fruteira estava mapiada na minha
mente, a época de caída de fruta eram acompanhada todo ano, os bebedores qual
secava primeiro e qual ia até o fim da seca, os saleiros, trieiros e passadores
e ainda tinha as cevas que eu fazia todo ano, sempre buscando um canto
diferente pra dar prazo pros bicho, o pouco de dinheiro que eu ganhava era para
semente de milho, pólvora, chumbo e espoleta, e no mais era uma enorme
felicidade aguardar a saída da lua cheia sentindo o cheiro da pólvora e
colocando da leitoa no saco.
As
noites de espera sempre foi o que eu mais amei, seguindo da caminhada de curso
na época das águas ou a do esbaro com o catingueiro desatento no fim do dia, mas
eu não desprezava de forma alguma um fim de tarde na ceva de Jaó e Inhambu com
o pio na mão, mas lá no fundo do meu coração eu sabia que tudo isso estava por
um fio, o destino logo tomaria meu mundo me levando para outros horizontes.
Eu não queria ir para a cidade, mais papai já tinha batido o
martelo de dado o veredito final, e como ele era o juiz e o júri não tinha nada
o que fazer além de obedecer, como dizia vovô em menino, mulher, empregado e cachorro
quem manda é homem. Então esse era o meu último ano no grupo, e no fim das águas
estaríamos eu e Lucas seguindo rumo da cidade, meu coração se apertava a cada
dia, e a partir daquele momento tudo passou a ter um sabor extremamente
melancólico, como dizia Zé Candido, o trem quando é pra lascar a gente, logo
chega.
Quando
pisquei o olho estava na casa da Tia Jurema lá na cidade, a roça agora ficou
para trás, era um sonho distante que somente nas férias eu voltaria a viver.
Meus olhos agora não tinham mais o brilho do garoto
negaceador de rolinhas, o sorriso se tornou amarelo, tudo ficou sem graça, aqui
na cidade não se ouve o cantar dos passarinhos, o barulho dos motores subindo e
descendo a rua tomavam conta do mundo, ao longe uma folha verde de um coqueiro
plantado por um morador tremulava com o vento, como que dando adeus a toda
natureza, o cheiro de relva não existia mais, agora o Grupo se chamava Centro
de Ensino de Segundo Grau, ali estava cheio de gente esquisita, com roupas
coloridas e cabelo parecido com os dos artistas que de vez em quando eu via nas
revistas, eles só sabiam falar da tal da televisão e de uns assunto tão besta
que me dava azia, então na hora do recreio eu me retirava para a praça depois
do pátio, onde alguns pássaros perdidos nessa selva de pedra ainda teimavam em
viver, ali eu ficava lembrando dos meus dias na fazenda.
Era muito difícil estar ali, mas era o sonho de mamãe e o
suor de papai, então eu tinha que fazer o melhor possível para que valesse a
pena o tamanho sacrifício, então garrei nos estudos como quem garra um
catingueiro no arado e só assim o tempo passou mais rápido, e no tempo de folga
me entocava na biblioteca onde me embrenhei nos livros que contava tudo
relativo a vida dos bicho.
Assim o ano passou depressa era o início das férias de fim
de ano, em julho infelizmente não podemos ir, então agora em dezembro era o
nosso primeiro retorno, as águas cobriam o mundo e eu com minha mochila surrada
pegava o ônibus na rodoviária rumo a fazenda, na bagagem uma saudade medonha e
sem fim de mamãe, papai e de toda lida mateira.
Logo encostou um ônibus colorido, e o motorista, um cara
gordo e simpático abriu a porta, dei minha passagem e fui para minha cadeira,
sentei agoniado para que ele ligasse logo o motor e pegasse a estrada, um casal
idoso criou um caso danado por conta de umas sacolas, mas sanado o problema
enfim tomamos o rumo, o brummmmm do motor titelava na minha mente em um vai e
vem de pensamentos que pareciam um furacão.
Pela janela meus olhos buscavam as recordações, a cada
quilometro que distanciávamos da cidade a paisagem ia mudando, o cinza sem vida
dava lugar ao verde dos capões, dos pastos pintados de melhore branco e gado
mestiço, meu coração se rebatia no peito e minha mente retrucava com meu galo
de briga, meu cavalo malhado, meu cachorro perdigueiro caçador de perdiz, com o
cheiro inesquecível da fumaça do fogão de lenha misturado com o cheiro da
deliciosa comida da mamãe.
Depois de 6 horas de viajem o ônibus finalmente parou no
acostamento, era minha parada, agradeci ao motorista e desci, fiquei parado
olhando a serra lá distante, logo à frente dos meus olhos estava a velha
estrada de terra que tanto cortamos ao lombo do cavalo e que carregava em cada
grão de terra a história da nossa família.
Ainda
tinha uns 30 quilômetros de chão para cortar na botina, para alguns podia ser
uma tortura, mas para mim, seria um grande prazer, a cada passo eu respirava o
ar puro que invadia meus pulmões, o som dos pássaros em algazarra, o pio da
perdiz fiuuuu fua fua, tudo aquilo me
fascinava, ia sonhando até que voltei a realidade ao ouvir uma buzina soar, era
seu Juca com sua caminhonete veia que me reconhecendo parou oferecendo carona,
cumprimentei o velho vizinho de roça, subi e sentei na caçamba, ali o vento
lambia meus cabelos e todo sertão voltava para a minha alma, logo na curva
beirando o pé de pequi ele me deixou, abri a porteira e desci a estrada
cantarolando, de longe pude ver a casa e as flores vermelhas do Flamboyant, os
cachorros iniciaram uma baita latição e logo papai apareceu com seu sorriso
largo grintando...
_ Meu filho voltou....Meu filho voltou...
Foi um abraço demorado, algumas palavras sussurradas e um
grande silencio chamado saudade que nos envolveu naquele instante, mamãe veio
correndo com o pano de prato na mão, e em soluços se juntou ao nosso abraço,
foi um momento único, um ano se fazia da última vez que meus pés tocaram esse
chão. O cheiro do café passado na hora se entrelaçava com o do requeijão que
era batido na panela grossa, enquanto no meio disso tudo estralava no forno em
tons amarelo com bege um tabuleiro entulhado de pão de queijo, sentado a mesa
eu queria comer, matar a saudade, conversar com papai e mamãe, saber das novas,
descansar um pouco e depois andar por toda fazenda.
Lucas meu irmão não veio, ficou para um tal de curso de
verão, papai no fundo sabia que as raízes dele estava na cidade, e que aqui
talvez poucas vezes ele voltaria, mas como dizia ele. Faz parte da vida, afinal
os filhos são para o mundo o importante é ter a certeza de ter orientado
corretamente ao ponto de colocar honra e ética na mente deles.
A
manhã passou feito um raio na noite escura de tempestade, logo o almoço estava
sendo servido, o que eu queria era comer aquela galinha caipira que somente
mamãe sabia fazer, arroz com pequi, e curau de milho, comida de mamãe é a
melhor comida do universo e isso é sem dúvida nenhuma, foi um momento fantástico
que saudade boa, em cada garfada eu me sentia voltando para o passado, depois
do almoço eu fiquei ajudando mamãe na cozinha, lavei os carote, ajeitei as colheres
de pau no varal, sobre a parede um arame prendia as tampa das panelas que
variavam de tamanho e forma, se existia um paraíso, o paraíso era aquele lugar,
a cozinha da fazenda.
Papai
veiaco que é, já tinha amarrado as redes a sombra da mangueira, depois de
encher o bucho, difícil foi se arrastar até lá e deitar, enquanto ele afogava
um pito, colocamos a conversa em dia, logo veio a cobrança, queria dados sobre
meu andamento na cidade e na escola, comportamento, notas e tudo mais, papai
labutava firme na lida e mandava ajuda pra gente todo mês, mais do que devido e
justo era eu e meu irmão honrar sua luta sendo bons alunos, bons filhos e não
dá trabalho para Tia Jurema que nos recebeu e cuidava da gente.
Eu
estava com meus 16 anos nessa ocasião, mas na roça um menino vira homem cedo,
pois a luta impõe disciplina e responsabilidade, diferente não poderia ser,
pois desde que me entendo por gente fazia papel de adulto, a conversa estava
boa mais meu pensamente estava na mata. Por ande andava os bandos de caititu,
as pacas, as cotias e os outros moradores da floresta.
Lá
no horizonte ao pé da serra onde o sol se escondia todo fim de tarde uma nuvem
preta forrava o mundo de água, a chuva marcava o céu como um véu que cobri a
mata levando vida, o vento forte logo ia trazer ela até nossa rede então
resolvemos se retirar para dentro de casa, logo o tintelar dos pingos cantaram
no telhado, as galinhas correram arrumando poleiro, e eu procurei o conforto da
velha cama, pela janela eu contemplava meu reino e a chuva linda que caia sobre
a terra, e nesse momento me senti como se nunca tivesse saído desse lugar, e
meu coração mais uma vez me disse, essa é minha vida.
Quando
a gente ama e é feliz, ai é que o tempo voa, foram os trinta dias mais rápido
da história, mal fiz o que eu havia planejado, a espera de paca, a caçada de
perdiz, a farofa de tatu, o arroz com Jaó, os dias se passaram e quando percebi
já estava na caçamba da caminhonete do seu Juca de corona com destino a cidade
novamente.
E
assim foram-se os anos, eu estudava com afinco e todas a férias eu corria para
a fazenda, mas o tempo sem tato logo passou e quando eu fui perceber já tinha
passado no vestibular para veterinária e estava com a mala pronta e passagem
comprada para a capital.
La
na capital a coisa era mais complicada, uma cidade maior ainda, cheia de carros
e prédios, com pessoas que corriam feito formiga carregadeira, ninguém falava
com ninguém, era a luta desenfreada da ganancia de se vencer na vida, ali
morava a angustia e a ansiedade.
Foram
cinco anos no curso de veterinária, no qual só pude voltar a fazenda por duas
vezes, cada dia a coisa apertava mais, livros e livros, teses, e experiências, minha
cabeça estava a mil com milhares de informações, alguns amigos tinham metas e
falavam em muitas opções mas o que eu queria era voltar para a roça.
Enfim
chegou a formatura, e pela primeira vez na vida papai veio a capital para ver o
resultado do seu esforço, o filho roceiro agora era um doutor, medico de bicho
como ele dizia, seu olhar cheio de lagrimejante mostrava o orgulho que ele
sentia naquele momento, tanto dele mesmo como de mim, mamãe era a felicidade em
pessoa, brilhava feito o sol do meio dia, acho que aquele dia era o dia mais
feliz da vida dela.
Sentados
ali na primeira fila, vestidos com roupa de festa e chapéu de feltro, fitei seu
olhar e pude ver seu cabelo branco, seu rosto enrugado demonstrava a luta
travada com a terra por todos esses anos, meu irmão Lucas era bem mais
estudioso, e logo partiu em um tal de intercambio para os Estados Unidos, fazia
medicina, ia demorar uns dois anos a mais para se formar, meus pensamentos iam
distantes e ali olhando seus olhos do meu pai vi um guerreiro gigante que no
cabo de uma enxada fez de seus filhos dois Doutores.
Logo
aquele momento acabou e tudo voltou para seu lugar porem o destino parecia não
estar de brincadeira, foi o prazo de Lucas se formar que papai adoeceu, Lucas
estava na residência quando papai faleceu deitado em sua cama na casa da
fazenda, mamãe franzina não podeira ficar sozinha, então a ideia de Lucas era
levar ela para a cidade, mas eu sabia, era uma sentença de morte, não poderia
deixar isso acontecer, ela já havia falado...
Pra
cidade eu não vou, quero morrer na nossa terra, e me encontrar com seu pai, sabia que tinha que tomar uma decisão rápida, então
não pensei duas vezes, ajeitei as malas e voltei pra fazenda, no caminho fui
pensando em tudo que essa vida nos faz, o custo de cada decisão, e que o mais
importante de tudo devemos buscar sempre a felicidade, devemos viver da forma
que amamos viver,, seguir nossa sina.
Logo
estava na porteira da fazenda, com minha mochila nas costas, tudo que eu amo e
amei estava aqui, a minha frente o meu mundo, meu universo, abri a porteira em
entrei com toda a certeza do mundo, de longe os cachorros danaram a latir, meu
coração disparou e senti no meu intimo que ali sempre foi o meu lugar.
Cheguei
a porta da casa onde mamãe me esperava, abracei ela com todo meu amor, chamei o
Valdir e pedi para selar meu cavalo, com a velha espingarda no lombo segui o
trieiro da serra, simplesmente seguindo meu destino...
Fazer
o que?
Se
é assim que meu coração sacoleja na caixa do meu peito, se é na lida que ele me
faz feliz, se é no cheiro do mato que me sinto vivo, se é no som da corredeira
do rio que eu respiro, se é no pio cansado e saudoso da Jaó que aperto minha
magoa, se é na voo retilíneo do casal de Canindé que corta o azul do céu que eu
viajo.......
Fazer
o que? Se essa é minha sina....Ser mateiro...
Bello
10-12-15
A TREITISSE
DAS GATAS
Estávamos, reunidos a sombra do velho abacateiro esperando
Seu Juca chegou, a proza era sobre a onça, dizia todo o povo na região que o
velho mateiro é o maior entendedor do comportamento da onça desses Goiás, filho
de um velho gateiro vindo do Para, trazia no seu olhar cansado pelos 80 anos de
vida todo o conhecimento daquelas matas, a brisa trazia de longe o cheiro do
cerrado, logo a figura lendária pontou no terreiro, com seu andar firme e com uma
garrafa de café na mão e um moi de copo na outra, puxou o tamborete e sentou
....Logo sacou do bolso um pedaço de fumo e ajeitando o preparo de um pito
cumprimentou os presentes...
Dia..... Oia o café...
Os
copos rapidamente tomaram cor e o cheiro do cafezinho da roça apareceu....E em
meio a comprimentos e sorrisos se iniciou a prosa....
Onça é bicho treiteiro, dizia Sr. Juca, e é os dois tipo, a
Pintada e a Parda, mas por ignorância do povo as bicha leva fama do que num faz,
nos causos contados por esse sertão afora o exagero do povo faz dela a maior
vilã da floresta, dando uma carga lendária de um mito tão fabuloso que atiça a
mente daqueles que na boca da noite cortam as brenhas desses matos e capões,
muitas vezes a imaginação acaba por falar mais forte que a razão, alarmando a
ira do povo na crendice de que onça.... É matadora de gente.
As
gatas carregam no lombo um montueiro de histórias, lendas e causos, trem que
vem dos antigos, lembro de meu Pai que gostava da lida de gateiro e desonçava
fazenda bolida por elas, quando o prejuízo chega na criação o fazendeiro se
sente no prejuízo e pede socorro, ai a pobre paga com a vida, e é nos
escondidos desse sertão que por mais de vez o dia amanheceu triste, pois mais
uma Gata morreu na tocaia, na armadilha ou no veneno.
Muitas
vezes a história ganha perna e vai pro rumo que o povo leva, lembro do causo do
veio Sebastião, que todo mundo garante que foi comido de onça, ele sumiu e ninguém nunca arranjou nada dele,
nem o sapato, também pro rumo da serra tem o causo do Juvêncio um veio caçador
que indo atrás de fruteira para marcar espera, passou por uma boca de grota e ali
ele deu fé de um gemido, besta veio sem experiência foi aprumar o que era, e
ao chegar na boca da grota veio o
estouro, ai foi só o grito, a gata pulou da escuridão virada num zetelo em riba
dele, os dois rolaram ladeira a baixo e ela num matou ele por sorte, que no
rebuliço caiu em um breu do ribeirão deixando a gata para trás, mas mesmo assim
chegou com muito sangue perdido, diz o povo que depois dessa nem esperada ele
quis fazer mais, o apuro foi tão grande que ele danou inté a falar sozinho.
Um
trem que pouca gente da cidade sabe, é que se a Parda tiver por perto ela corre
com a pintada, a bicha é mais brava, e com mais agilidade, e usa isso contra a
parente que mesmo sendo mais forte perde movimento pela truculência, então na
maioria dos confrontos ela bate bem na Pintada, porque ela tem mais feitio de
gato e isso a faz mais lisa, difícil de acertar.
Depois
de colocar a Pintada pra correr, ela vem proteger a gente, ai nos acompanha
campo afora, o cabra desavisado ainda
fica com medo e tenta o mal contra a bicha, eu que lidei com elas por esses
anos todos digo com experiência de mateiro veio, onça pegar gente, hum hum, é
coisa que num é bem verdade, onça pode inté correr com gente, pro mó da defesa
do território ou por estar com as cria, pra proteger os fiote inte passo preto
vem em riba da gente, imagina ai uma gata parida com gatinho pra zelar.
A
gata pintada é bicha cabeçuda, de porte baixo e de caixa forte, suas pintas são
sua identidade, num tem onça de pinta igual por esse mundo, é engraçado que o
pé da frente tem cinco dedos mas um não deixa rastro pois num beira o chão,
diferente do de trás que só tem quatro dedos, veiaca que é num anda bestando em
campina não, gosta das bocaina mais fechada, onde anda mansa caçando sorrateira
a beira da noite, vive por essas brenhas atrás da porcada, mas num perdoa uma
mateira, ou um tatu, ou mesmo um bandeira, a bicha é mermo treiteira, come o
que aparece, inte peixe em lagoa secando ela pega.
No rastro a gente logo consegue num rápido olhar saber quem
passou marcando a trilha, a almofada da Pintada é grande e redonda, os dedos
são arredondados também, já a Parda tem a almofada mais triangular, dedos mais
longo e fino, é bem mais afunilada, então não tem errada.
Uns
povo diz que ela pesca usando o rabo, se é verdade eu não sei pois nunca vi,
mas que muitas vezes ouvi o caso, há isso eu posso afirmar, é causo contado em
toda prosa onçeira, esse causo da onça pescadora é antigo, as gata é bicha
andadeira trilha longe pra mais de dez léguas, o território é grande de amuar,
principalmente o do macho que é mais andador, as fêmeas tem território menor e
tem mais tolerância, mas as vezes dana a dar briga, basta de ter motivo de
andar onde não se deve.
Ortro trem que o povo fala é que onça num pega anta, pega e
pega das grande, onça pintada tem força para bicho de mais de trinta arroba,
diferente da parenta parda que só pega porqueira, a pintada morde firme por
riba do pescoço da nuca pra cabeça, se mordeu por baixo na goela foi parda, é
igual essa história de cobrir a carniça de paia, foia ou graveto é pura
conversa, quem faz isso é a onça parda também, o que a gata pintada faz e
carregar pra comer longe, sempre dando motivo de começar a janta pela barra do
peito ou pescoço.
As
onça pretas são da merma pintada, tem um tal de melanismo, tem as maia
encoberta que no mover do pelo a gente enxerga as manchas e a preta pura que é
mais rara, as duas nascem inte na mesma barrigada, uma vez topei com uma
cruzando o rio com dois fiote, um preto e um pintado, mas tem uns povo besta
que fica maldizendo a onça preta, uai, só porque a bicha é preta feito eu, é
perseguida, o povo diz que ela é mais brava, mais perigosa e que inté tem poder
de bruxaria por ter trato com o tinhoso, o bestagem, é tudo onça, tudo onça.
Ela pode inté parir de quatro gatinho, mais o normal pra se
ter serventia é de dois, a prenhisse dura de três a quatro meses, a bicha
sempre ajeita toca para parir, com duas semanas já tão de zoinho aberto, e fica
no leite inté uns 4 meses assim que pegam tutano já começam a acompanhar na lida
da caça, mas rumo mesmo só tomam quanto passam de dois anos, afinal tem que
aprender com a mãe a se virar nessa vida, lida de bicho no mato não é fácil,
bicho passa fome e sede se não for astuto.
Todas
essa diferençada dizia meu veio Pai veio de uma Treitisse das Gatas, uma história
que é mais ou menos assim.....
Diz
a lenda que a Pintada e a Parda já foram grandes amigas, isso no tempo em que os bichos falavam, sempre
andavam pareadas, uma completando a outra em uma baita parceria na lida da
caça, cortavam essas matas de um lado para o outro, sempre juntas negaceando a
porcada, campeiros, antas, tamanduás, tatus, mateiros e inté mesmo a criação
alheia, uma ajudava a outra, na hora do ataque no baque do pulo a Pintada
mordia no cangote beirando a nuca e a Parda mordia por baixo na anca do
pescoço, ai num tinha boquinha, o trem sentava mesmo, dessa forma eram
infalíveis e não faltava o de comer.
Se
fosse pra guardar o restante as duas carregavam para um lugar seguro e juntas
cobriam a carcaça com folhas ou gravetos, pra mó de preservar a carne por mais
uns dias, em caso de falta do de comer, se as coisas apertassem podiam voltar
que tinha reserva e assim juntas tocavam a vida por essas sertanias de mata que
formam esse mundão de meu Deus.
Para
demarcar o território as duas, urinavam, defecavam e zunhavam as arvores por
todo lado, esturravam juntas avisando os invasores que estavam ali, em uma
eterna amizade tudo que faziam procuravam a ajuda uma da outra, em algumas
tarefas a Parda se destacava por sua estrutura menor, era mais veloz e por
natureza de sobrevivência mais astuta que a pintada, porem como a companheira
era mais forte, valia-se a lei da selva, o mais forte manda, afinal a Pintada
como o maior gato das Américas era a chefe suprema da dupla, isso porque a
Parda por nunca ter enfrentado a oponente companheira não tinha noção do seu
potencial.
Valendo-se
disso a Pintada começou a se aproveitar da companheira, que trabalhava
arduamente na lida de rastrear e buscar pontos de caça, enquanto isso ela
dormia em meio a mata fechada, no frescor da beira dos rios e córregos,
preferia andar depois do escurecer, e só caminhava bem no serviço uma parte da
noite, enquanto todo o batido pesado ficava a cargo a franzina companheira.
Diz
o povo antigo que por pouco as duas danaram a se estranhar, e num breve prazo a
amizade se estreitou, aquelas brincadeira e bajulações foram acabando Inté que
um dia a Parda se zangou, chegava o fim uma vida de paciência , afinal sempre o
melhor da caça ficava pra pintada que se deliciava com o quarto traseira e os
miúdos deixando o pior da carne de ossada para a companheira, sem falar que
tinha que esperar a grandona se alimentar primeiro e por último sempre se
contentar com os restos deixados pela amiga, isso era só uma parte entre outras
humilhações que ela passava.
Com
o passar do tempo isso foi criando ranço, inte que um dia a parda enfrentou a
companheira mesmo sendo menor e mais fraca, mas pelo fato da Pintada ser mais
pesada e mais lenta, a Parda lhe deu uma boa surra, aproveitando da velocidade
e agilidade, com o corpo que é mais leve e mais esquio, saiu na frente, isso
lhe rendeu um balaio de vantagem e desse dia em diante as duas nunca mais
caçaram juntas e passaram a se evitar, virando eternas inimigas.
INICIAVA
AI UMA GUERRA QUE DURARIA PARA SEMPRE.
A
crise da brigaiada rompeu mata a dentro no ouvido de toda bicharada, que fincou
rumores de uma crise em toda floresta, pois a guerra se acentuava em todo canto,
até que chegou ao tribunal da floresta o pedido de acordo das Gatas, o Macaco Prego
veiaco e sem juízo foi nomeado o Juiz, afinal de cima da arvore a onça não
podia pegar ele se não concordasse com a sentença, logo reuniram os animais
mais sábios, Dona Coruja foi quem ficou junto com essa turma ficou a cargo de
fincar um acordo entre as duas primas, de forma a amenizar a guerra.
Foi
feito então uma grande equipe, onde o tamanduá ficou responsável por redigir o fato
junto com o Tatu Canastra, pois a tempos atrás também passaram por problemas
semelhantes, como testemunha entraram também a Jaó e a Perdiz que também
passaram por conflitos no passado, mas isso é uma outra história que um dia
contarei procêis.
Nos
galhos pássaros de toda sorte, nas redondezas vinha bicho de todo lado inté que
lotou todo capão, já não tinha espaço nem pra formiga quando chegaram sem
conversar as duas primas e se apresentaram ao juiz...
Depois
de muito debater o júri chegaram a um veredito, foi ai que o Macaco Prego ditou
a
sentença, nasciam ali novas regras, de agora por diante por ordem desse Tribunal
da Mata, ficou determinado o seguinte
acordo.
Para
demarcação do território a pintada teria direito ao esturro, a parda somente ao
miado, mas caberia o direito de livre transito entre os territórios das duas espécies,
ficando claro que evitariam confronto.
Na
parte da caça, a pintada ficaria com os animais maiores porem sempre abatendo
com a mordida na nuca e deixaria os menores a cargo da Parda que somente
abateria pegando pela garganta, deixando assim claro o feito de cada uma.
Do
reservado da carcaça, a pintada poderia carregar para onde fosse, mas não
poderia cobrir, para que não houvesse roubo de comida entre ambas somente a
parda cobriria a carcaça com folhas, ramos ou gravetos, ficando assim claro a
dona da comida, e em caso de pegar uma comendo a caça da outra teria briga na
certa.
E
ainda mais, a Parda passaria a proteger o homem da astucia e perseguição da
Pintada, tendo o direito de lhe dar uma surra sempre que ela bulir com gente,
ficando a Pintada expressamente proibida de se alimentar de gente, atacar
humanos somente em caso de defesa dos filhotes ou da vida.
E
como não se davam mais como parceiras, seriam solitárias, cada uma cuidando da
sua lida, não podendo mais se dar com os viventes da floresta.
E
por causa desse acordo as coisas hoje são como são, e pra evitar desatino a
Pintada nunca mais boliu com gente, tirando algumas treiteiras que não cumpre
trato, mais trem sem tino nem respeito...kkkk... Isso tem em toda raça de
vivente...kkkkk...
Bello
12-10-15
Em várias entrevista a sertanejos
a onça-pintada foi considerada como uma ameaça ao ser humano, em mais da metade
das entrevistas foi apontada como perigosa apenas em determinadas situações
(particularmente quando está com filhote ou se alimentando, em defesa do território
ou quando acuada).
Em junho de 2008, um pescador foi
atacado e parcialmente devorado por uma onça-pintada em Cáceres (MT), enquanto
acampava na beira do Rio São Lourenço. Este foi o primeiro caso registrado
oficialmente no Brasil pelo CENAP (ICM-Bio) de um ataque de onça-pintada a um
ser humano envolvendo predação. O acontecimento foi tema de matérias de jornal
e televisão na época, e sua repercussão envolveu uma série de questionamentos
sobre os limites das relações entre humanos e onças.
Ficando claro que em registros
oficiais casos de ataques de onça pintada ou parda a seres humanos são
raríssimos, e que registrados no Brasil conta-se no dedos de uma única mão os
ocorridos, sabe-se que o mosquito mata muito mais que as onças, então ao ir
para a mata procure orientação de pessoas da região, evite locais demarcados
por fezes, urina e arvores unhadas que caracterizam um ponto preferido do
felino.
Grande abraço.
DE FLORES,
FRUTOS E TEMPO
A todo tempo a natureza matuta que é, encontra meios de
levar amparo a sobrevivência dos viventes da mata, outrora o tempo trabalha em
suas estações, trazendo assim uma variação no clima de forma a fazer brotar o
alimento no momento certo, ou cai flores ou cai frutos, e assim se faz em todo
o mundo e aqui no centro oeste a maior savana de cerrado do Brasil não é
diferente, e assim também sucede no meu Goiás.
Cada estação do ano em cada região tem suas peculiaridades,
aqui o tempo anda meio variado com a bulinancia do homem na natureza, mas seque
mais ou menos no seu prazo, é certo que a cada ano a coisa sofre uma variação,
para mais ou para menos, de certo que tem ano que a fruteira vem mais cedo, em
alguns caso falha, ou vem mais tarde, mas a mãe natureza é caprichosa e não
deixar faltar o comer.
E o ano vai passando e nos seus doze meses de duração a
natureza vai trabalhando de forma justa e harmoniosa, dentro de uma variação
que mais parece calculada do que apenas um mero capricho do acaso do clima.
Janeiro
é o ápice das aguas, a chuva lava as matas, tudo está mais verde e vistoso, a
campina com seu capim bem alto com folhas largas e carnudas esconde o filhote do
Veado Campeiro, os passarinhos se ajeitam para a choca, uns já estão é tirando
a filharada, outros já treinam o bater de asas à beira do ninho, é o mês dos
filhotes.
Fevereiro
ainda cai muita chuva, mas agora o sol começa a se fazer mais presente, é o mês
mais curto do ano, e passa que a bicharada ainda na fartura mal perceb e o
correr da carruagem, o capim verde se faz farto, e as pintas do filhote de anta
começam a sumir, assim como as do veado mateiro.
Março, é
o início do outono e já começa a diminuir a incidência das chuvas, aos poucos
se inicia a estiagem, os rios param de subir até o dia de São José, que é no
dia 19, e inicia um novo ciclo, é o início da seca, a chuva vai se tornando
mais escarça, e muitas flores e fruteiras já entram em produção no cerrado e
nas matas.
Abril a
mata ainda está linda, verde, entranhada de ramos novos, a filhotada na sua
maioria já tomaram seu rumo, muitos vão começar a se acasalar novamente, o
ciclo da vida se reinicia aos poucos, se fazendo real a frase. Tudo acaba onde
começou.
Junho é
o início do inverno o tempo avermelha, o frio vem chegando devagar, a mata já
mudou de cor, o verde vivo vai aos poucos cedendo espaço para o marrom claro,
as folhas começam a cair e forrar o chão da mata com um tapete de matéria
orgânica proposital para que se transforme em adubo no início das águas.
Julho o
frio se apruma e chega mais firme, as grotas gelam e os bichos pouco andam, em
alguns pontos os pequizeiro se enchem com suas flores brancas, vistosas,
carnudas e de cheiro bom, o capim maltratado pela seca se pinta de branco, onde
os veados, pacas, cotias, antas, catetos, queixadas e muitos outros viventes
fazem a festa, na buchada é só flor, mas a florada pode variar entre junho até
setembro, a natureza sabendo da necessidade ajeita muitos recursos para a
estação da seca, flora também o Canudeiro, que muitos chamam bonequeira e
outros nomes mais, as vezes vem temporã a Mirindiba que também sofre muita
variação de lugar para lugar, muitos viventes começam o acasalamento, pois a filhotada
tem que nascer no meio para o fim da estação das aguas onde a fartura é certa.
O veado Campeiro macho pega cheiro forte astucia natural para encantar sua
fêmea.
Agosto
é o mês dos ventos, o vento bruto enverga o capinzal e balança as arvores do
cerrado e da mata com a função primaria de espalhar as sementes, para quando a
chuva chegar germinar vida para todo canto, inicia-se também as queimadas, mas
a Mãe natureza preparou o cerrado para suportar o fogo, suas arvores
retorcidas, de casca grossa foram projetadas para tal desagravo. Enquanto o
fogo varre as campinas, do ponto mais alto o gavião e o carcará esperam o fogo
quetar para fazer o limpa nas pequenas vítimas que não conseguiram escapar das
grandes labaredas que lamberam a vegetação seca.
Setembro
é o início da primavera e o ápice da seca no centro oeste, os rios
aprofundam-se nas calhas, as lagoas e bebedouros se tornam escassos, os animais
e plantas almejam a chuva e para acalentar um pouco o céu se enche de nuvens e
aos poucos se carrega derramando a chuva do caju, o caju do campo precisa
florir assim como outros frutos, pois é mais um recurso de alimento esperado
pela bicharada, dona Anta circula cada pé colhendo o que pode, o Lobo Guará
também não perdoa, sem falar nos trem de pena e nos pequenos marsupiais, que
rondam a orla da mata fechada em busca da iguaria, muitas arvores estão sem
folhas e toda mata começa a pedir socorro, essa pequena águada também faz
brotar o capim na queimada onde os Campeiros fazem a sua festa.
É
a época do Jatobá, do Tamburil a orelha de macaco, da Caraíba com suas flores amarelas,
dos Ipês e as aleluias logo após a chuva do caju (formigas aladas), tomam conta
do cerrado em grandes quantidades, onde vão formar novas colônias, é a festa da
passarinhada, da perdiz, das codornas a tesourinha aparece, tiranídeo que é
devora o maior número possível de aleluias,
Outubro
o céu começa a se pintar com nuances
escuras anunciando a mudança do clima e em meados de outubro se inicia a época
das águas, com pouco tempo a paisagem se
transforma agora o verde toma conta de tudo, a Perdiz canta no campo buscando
se acasalar, os pássaros fazem algazarra, e uma felicidade imensa toma conta de
tudo, nada mais bonito que ver do os Veados campeiros saltarem de felicidade ao
cair uma garoa, as varas de porco transitam mais, e as estradas de terra batida
passam a ser a prova viva do movimento da vida no Goiás, é rastro para todo
lado, alguns Jatobazeiros ainda despejam frutos no chão da floresta, e o Tamboril também já chega no fim da sua produção, agora
molhado e amargo somente a Anta mesmo para aprecia-lo.
Novembro
o verde retorna a campina e as matas se renovam, os trieiros começam a se
fechar e num toque magico da mão do criador tudo se transforma, os rios ganham
força, os peixes sobem na piracema, e os rios, córregos, riachos e lagoas
ganham corpo, agora tem água para todo lado reservatórios naturais para
resguardo da próxima seca.
Dezembro
é o início do verão e tudo já se transformou a cortina de chuva é constante, o
céu está sempre carregado, a Copaíba o Pau d´óleo em alguns pontos começam a
florir, a mata fica multicor, e a vida se torna fértil e prospera para mais um
ano de lida nos rincões do meu Goiás.
As fruteiras são as meninas dos olhos dos bichos e dando ela
aguardo ou não, cada uma tem sua importância na vida que pulsa no Centro Oeste,
cada uma com sua força, sua vantagem e desvantagem, seu sabor, sua cor, seu
cheiro.
De certo eu digo uma coisa, a natureza surpreende mesmo pois
a maioria da frutas e flores chegam no cerrado justamente na época que os
animais mais necessitam de alimento, e isso é a mão de Deus.
Gabiroba
é fruta suculenta, variando de cor do amarelo ao avermelhado, com seu sabor
amargo frutifica geralmente em setembro, da mesma família da goiaba é iguaria
para a paca, a cutia, jacus e outros vivente, paca chega a fazer barrigada
somente da pequena fruta, mas muitos pássaros e animais se alimentam dela.
Mirindiba
é árvore vistosa, bonita de se ver quando se cacheia de frutos, e isso tanto acontece
ela tendo 3 metros ou até com 25 metros de altura, suas folhas aveludadas de
tom verde escuro se concentram mais na pontas dos galhos. Seu fruto cheiroso e
de cor amarela para o laranja é chamariz para todos os viventes, existe dois
tipos da fruteira, a mirindiba-da-mata (Buchenavia tomentosa) tem a fruta maior
e folhas menores e mais lisa. A mirindiba-do-cerrado (Buchenavia capitata) tem
a fruta menor e folhas maiores mais ásperas, quando dá num ano falha no outro,
é sem dúvida alguma a preferida da bicharada. A época da florada varia por
demais do clima e do lugar, algumas começam a florir em janeiro, e o fruto
amadurece entre agosto até meados de outubro, mas na maioria do Goiás está boa
de aguardo entre meados de julho e agosto para meados de setembro.
Umbaúba
é arvore de beira d’água, mas também frutifica no cerrado, arvore de tronco
leve e bom para boiar, quando menino adorava fazer jangadas com tronco de
umbaúba, seu fruto de cor marrom lembra uma banana, é de bom sabor. Normalmente
é em julho mas varia até fevereiro dependendo do clima e da região, lembro-me o
tanto que dava trabalho derrubar o fruto da umbaúba que eu tanto gostava de
comer quando fazia minhas caçadas de estilingue a beira dos rios do centro
oeste. Muitos bichos apreciam seu fruto, paca, macacos e um bando de trem de
couro frequenta a fruteira, mas os pássaros é que fazem a festa, principalmente
o corrupião com sua cor laranja e preto se destacando com o azul do céu do
Goiás.
Pau d´óleo
ou a Copaíba, é arvore vistosa de bonita, e logo se destaca no meio da mata com
suas folhas miúdas e de tom avermelhado, os antigos esperadores tinham e
passaram a crença de que bicho que come do Pau d´óleo é difícil de morrer, se
isso é verdade eu não sei, mas que parece ser verdade parece, pois eu já ouvi esse
relato da boca de muito mateiro que garante de pé junto ser fato real, outro fator certo é que o gosto forte da fruta
impregna na carne do animal que ali se alimenta , dá aguardo tanto na florada
como na queda do fruto , a florada varia
de dezembro a março, mas logo se cacheia
de frutos que começam a pintar o chão da mata variando de junho a outubro.
Baru
floresce em meados de outubro, mas os frutos amadurecem e caem em agosto, sua
castanha é alimento de muito vivente também, mesmo muita gente não dando
atenção ao baru, ele tem sua importância no ciclo do cerrado.
Murici tem
uma grande variação dessa frutinha cheirosa, tem o murici-rosa que é típico das várzeas, o
murici-do-brejo é típico dos murunduns, muricizão e outros muricis no campo,
cerrado e cerradão, porem ambos estão recheados de frutos em meados de
dezembro, alguns frutificam de maio a setembro, e isso vai variar muito do
tipo, do clima e da região, trem bom é uma boa cachaça com a fruta em fusão, o
fruto cheira longe e a paca e cutia chega a sair da mata para se banquetear com
a queda dos pequenos frutos, que também alimentam a muitos animais.
Canudeiro
também é conhecido como bonequeira, e
outros nomes mais, é uma arvore típica da área mais aberta do cerrado e iguaria
para o veado campeiro, mas é apreciada por muitos outros bichos como a anta, o
cateto, sua flor branca e carnuda aparenta realmente algo saboroso, muitas vezes se destacando no ermo do
cerradão, ou mesmo a beira das campinas com suas flores grandes e brancas, florescem
em meados de junho a julho podendo variar até o mês de agosto.
Cagaita tem
da amarela e da vermelha, e é trem para se comer pouco, pois o nome faz justiça
a fruta que solta o intestino que é uma beleza, inda mais se tiver quente de
sol, ambas florescem nos mês de agosto até setembro e os frutos amadurecem
entre setembro até outubro quando inicia as primeiras chuvas, a porcada não
perdoa e sai limpando o chão, o Catingueiro também come, o lobo Guará, a
raposinha e outros mais, alimenta uma infinidade de pequenos animais e pássaros.
Mangaba
é trem bom demais, lembra o gosto do abacate, e é manjar dos Deuses para dona
Anta, mas depois que amadurece acaba rápido, geralmente floresce de julho a
setembro e os frutos amadurecem entre setembro e dezembro, é típica do cerradão,
a passarinhada também faz festa, mas como falei é banquete rápido.
Pequi
é sem dúvida alguma o fruto mais conhecido do cerrado, típico na culinária
goiana e mineira, ninguém resiste a um bom arroz com pequi, ou uma galinha
caipira, o fruto sempre foi admirado pelos índios brasileiros, mas é a esperada
mais injusta que existe, principalmente se tratando dos veados, que estão na
época da reprodução, suas folhas mudam antes da florada e logo o pequizeiro
fica todo vistoso se destacando na cor opaca do cerrado, suas flores brancas
com pontas amareladas, são carnudas cheirosas, e é a salvação de alimento para
época da seca, é o ponto forte da espera mas no fruto também dá bons resultados,
muitos viventes adoram se fartar com a flor que cobre o chão no amanhecer e no
fim do dia, mas com a primeira chuva azeda e o rendimento cai bastante, geralmente floresce entre julho e setembro e
os frutos a amadurecem entre outubro e dezembro, podendo falhar ou variar de
acordo com o clima e o local.
Bacupari tem o rasteiro de chão e tem o de pé, nas campinas não
cresce muito mas na mata vira arvore grande, típico do cerrado, sua casca
amarela aveludada, guardam no interior um caroço com uma polpa saborosa. Muitos animais e aves se alimentam dele, o
bando de queixadas quando passa faz o limpa, frutificam geralmente entre
dezembro e abril podendo variar, gostoso por demais para se comer cedinho ainda
geladinho do orvalho da noite.
Marmelada
florescem de agosto a fevereiro. As frutas amadurecem de julho a setembro, indo
do verde ao roxo. Os outros marmelos frutificam de novembro a fevereiro. Há
marmelos macho e fêmea, que se diferenciam pelas flores: as flores masculinas
são pequenas e aglomeradas; as femininas são grandes e solitárias. É necessário
ter machos para que as fêmeas produzam frutas, lobo guará, anta, raposa e
muitos viventes gostam do fruto.
Jatobá
é arvore grande que se destaca na mata,
com folhas arredondadas de tronco grosso, floresce entre novembro e janeiro e
os frutos amadurecem entre julho e setembro, lembra um grande amendoim, com um
pó amarelado sem seu interior, as cutias e pacas roem sua casca grossa e marrom,
dona anta também adora o jatobá, assim como os queixadas, catetos e muitos
viventes da mata como os quatis, o guaxinim o mão pelada e outros viventes mais.
Ipê
é arvore bonita que embeleza as matas e o cerrado do centro oeste, os ipês do
cerrado florescem de julho a agosto e os frutos liberam as sementes entre
setembro e novembro. Os ipês da mata florescem e frutificam de agosto a
dezembro. O ipê-branco-do-brejo (T. dura) frutifica duas vezes ao ano, entre
março e maio e entre setembro e novembro, o veado anão, o catingueiro e o
mateiro apreciam a flor do ipê, assim como muitos outros animais, mas
dependendo da região tendo outra fonte de alimentação é florada de pouco
trieiro.
Ingá é o fruto da ingazeira, vargem com
caroços de popa carnuda, geralmente florescem entre março e abril. O
ingá-de-metro e o ingá-mirim frutificam em julho e agosto, mas podem frutificar
mais vezes por ano, se houver disponibilidade de água. O ingá-mirim e o
ingá-facão frutificam entre setembro e outubro, muitos viventes se alimentam de
seu fruto principalmente os macacos, tucanos e aves em geral.
Tamboril
também chamado de orelha de macaco, tamburil, e outros nomes mais, floresce e
frutifica de julho a setembro, é festa para os queixadas, veado mateiro, e
outros cervídeos, dona anta adora, comum em grande parte dos Goiás é aguardo de
boa qualidade, é arvore alta de copa encorpada que de longe chama a atenção até
dos que nada tem de mateiro.
Caju
também chamado de cajuí, típico dos campos e campinas do cerrado o caju
rasteiro flora em julho e frutificam em setembro, é alimento perseguido pelo
lobo guará, pela anta, pelos catetos e muitos andantes do cerrado, até a ema
come dele, pequeno e com pouco doce, ainda é apreciado para doces e sucos.
Lobeira
é sem dúvida uma das frutas mais mal interpretada do cerrado, suas folhas espinhosas e seu aspecto rustico,
chama atenção quando floresce, suas flores pequenas e roxa realmente é uma das
mais bonitas no meu ponto de vista, existem dois tipos de lobeira, a da mata que frutifica entre agosto e outubro e a lobeira do cerrado floresce e dá frutos entre
março e julho, seu nome vem do apreço que o lobo guará tem pelos seus frutos,
que também é apreciado pelas raposas e outros viventes prevalecendo os canídeos.
Buriti
também chamada de Palmeira do brejo Floresce quase o ano inteiro, com maior
intensidade de janeiro a abril os frutos amadurecem principalmente de novembro
a janeiro, seu fruto é muito apreciado para doces e licor, paca, catetos,
queixadas, anta e muitos outros bichos apreciam seu sabor, vistoso se sobressai
nos brejos e é sinal de presença de água para.
Caraíba
sua flor amarela é muito confundida com a do ipê, floresce de julho a agosto
levando coloração ao cerrado castigado pela seca, catingueiro faz trieiro para
se alimentar de suas folhas que cobrem o chão da mata, chega a defecar amarelo.
Araticum
também conhecido como cabeça de nego floresce em agosto e setembro e os frutos
amadurecem de março a maio, seu cheiro vai longe, e quem come dele arrota seu
sabor por longo tempo, chama a bicharada de longe, muito apreciado pelos canídeos,
porcos e pela anta.
Falar
dos frutos e flores do cerrado é uma tarefa árdua e ingrata, pois a variedade é
tão grande que se eu falasse de todos daria um grande livro, dei prioridade aos
mais conhecidos, mas por ai já se tem uma ideia da riqueza e variedade do
clima, flores e frutos do cerrado, espero ser útil a muitos amigos que gostam
desse tema e também amam esse bioma maravilhoso e incompreendido por muitos que
prevalece no centro oeste do Brasil, principalmente no meu tão amado Goiás.
Bello
18-09-14
OS
OPORTUNISTAS
Tião era cabra franzino, só foi pegar corpo depois dos 30,
desde a infância foi incutido de lida com bicho, passava o tempo de recesso da
escola na fazenda do seu avô perambulando pela mata e matando o que conseguia
colocar na mira da sua bate bucha, caçada e pescada era basicamente seu meio de
vida, e dessa forma se fez grande conhecedor dos mistérios da ciência desse
povo treiteiro que persegue a caça feito onça parida e o peixe feito ariranha de
bucho vazio.
Mas Tião era home difícil, de temperamento opinioso e
resmungação sem sentido, sem o menor
conceito de consideração ou mesmo amizade, se lhe tivesse serventia estava
junto, se não, apartava, e para rancar o couro não tinha dó, assim como fazia
com os bicho, fazia com aqueles que lhe admiravam, era uma questão de tempo,
bastava dar bobeira.
Na pequena vila em que tinha moradia, era famoso caçador e
como os tempo tinham mudando, o jeito do povo ver as coisas também mudou, essa
fama além de ser pesada, por ser visto como destruidor da natureza, lhe trazia
o olho gordo da lei, que agora tratava morte de bicho feito assassinato de gente.
Mas isso num assustava o veio Tião, ele se sentia
inatingível, e quando os mais novos vinha pedir um ensinamento de caçada ele
além de humilhar inda caçoava deles, e isso o fez muito mal visto nas
redondezas, conhecido como oportunista e tirador de vantagens.
Amigo fiel dos que lhe podiam trazer benefícios e inimigo
mortal daqueles que nada tinha a oferecer, o trem bom mesmo era o que estava
sob sua posse, o do alheio, nada valia, e esse jeito complicado de lidar com as
pessoas lhe trouxe muitas picuinhas de calunia desmedida.
Na vila em que Tião tinha morada, também viva um homem por
nome de Manoel que era seu aprendiz de caçada, e seu capacho. Tudo Manoel fazia
para agradar o desagradável e ganancioso Tião, que pisava nele o humilhando de
todas as formas possíveis, mas o tal Manuel não ficava pra traz, em matéria de
ser parecido com seu mestre, afinal nada mais justo do que lobo andar com lobo,
os dois se faziam por merecer.
E nessa Tião pisava em Manoel e vice versa de forma que era
um tentando passar a perna no outro, na falta da moral, o que manda é o
oportunismo.
Inté
que um certo dia, Tião descobrindo uma macega de mata repleta de caça escondeu
do velho amigo o rumo que estava indo, tinha que garantir o cobre do bolso pois
sempre tinha uma paca, ou um queixada, ou um mateiro para vender, sem falar nos
tatu, e outros trem mais, fazia isso as escondidas, sempre a sete chaves, mas
muitos comentavam e sabiam dessa sua treita de vender caça.
E assim se foi por um bom tempo, sem saber Manoel também
descobriu o mesmo local, e a ganância o fez ficar calado, queria tudo só pra
ele, mas nunca imaginou ser o mesmo ponto do amigo, e como Tião a muito tempo
vinha negando empreitada, resolveu também comer calado, e com o olho grande de
querer ter mais peças para vender, resolveu preparar uns dez trabucos de calibre
pesado, daqueles que ficam armados e quando o bicho passa no trieiro e esbarra
na linha ele desarma atirando e matando o desavisado.
Então
Manuel em um fim de tarde andando pela mata para armar as armadilhas encontrou
um trieiro batido e imaginou ser caminho de mateiro ou queixada, com pouca
experiência e sem pensar muito pois o
sol já ia lambendo os montes procurando a noite, armou ali três trabucos, para
garantir a morte do mateiro, o que ele não sabia, era que ali era o trieiro do
velho Tião no rumo de uma ceva bem escondida, que ele logo a frente sempre
mudava o rumo pra não ficar marca de andança de gente, para que ninguém achasse
a ceva.
Naquele
mesmo dia Tião atrasado com seus afazeres chegou tarde na mata, já quase
escurecendo ele rompeu rápido pelo trieiro com a traia num saco de linho, e a
cartucheira 28 nas costas, foi quando se esbarrou no primeiro fio da armadilha
fazendo disparar o canhão, o tiro de calibre pesado e muita pólvora, fez um
estrondo gigantesco na mata, apesar de ter sido carregado com chumbo médio
estourou sua perna e ele caiu gritando, o saco foi para um lado e a 28 para o
outro, sangue escorria feito boca de
nascente para todo lado, ele tentou levantar, e caiu de novo, foi se arrastando
e deu com o segundo fio que acionado, fez disparar a outra armadilha acertando
seu pescoço e parte do rosto, tentou se arrastar mais ai não teve mais força, o
tempo escureceu e findou ali sua trajetória de caçador afamado.
No
outro dia cedo Manoel chegou para conferir o que tinha pegado os canhões,
desapeou da mula, juntou dois sacos no lombo e foi confiante de que teria no
mínimo uma feira para levar para casa, com mateiro, tatu, paca, cotia, seria
como fazer compras na bodega, porem ser ter que passar na presença do velho
Caixeiro para deixar o cobre.
Passou
na primeira armadilha e tinha um verdadeiro pra mais de 5 quilos, sorriu
confiante do bom resultado, passou na segunda e nada, inté que pontou no
suposto trieiro do mateiro, ai o desespero tomou conta da sua alma, viu no chão
banhado em sangue o companheiro Tião, na agonia largou tudo e correu para
acudir o amigo achando que ainda estava vivo, mas quando tocou no companheiro e
sentiu o corpo já resfriado pela morte entrou em completo desespero, e no vai pra lá, vem pra cá, acabou se esbarrando
no terceiro canhão que disparou acertando suas duas pernas, sendo que a direita
ficou mais ferida e rompeu veia grossa de forma que o sangue esguichava longe.
Ai
foi que Manuel ficou doido mesmo, danou a chorar e a gritar por socorro, a
chamar por Deus e por tudo que é santo, e como estava longe demais da mula,
sentiu a morte tocar seu rosto, tentou levantar mais não conseguiu, o desespero
lhe tirou o pensamento, junto com isso veio o remorso de ter matado o melhor
amigo, e foi se arrastando até onde suas forças conseguiram lhe levar.
Quatro
dias depois Seo Policarpo, o vaqueiro da fazenda viu de longe a rodia de urubus
acima do capão e pensando se tratar de treita de onça em criação foi assuntar
do que se tratava, passando pela vereda encontrou a bicicleta de Tião escondida
numa moita, e logo estranhou. Do outro lado já beirando a mata deu com a imagem
da mula amarrada e já deitada sem forças, entrando no trieiro logo topou com o
corpo de Manuel que faleceu a uns 20 metros da mula, rancando capim com a mão
tentando chegar no socorro, entrando mais na mata acompanhando o movimento dos
urubus, deu na batida de Tião e logo abaixo encontrou seu corpo já repleto de
formigas e bicado pelos carniceiros.
Ai
foi um furdunço de disse e me disse, para chamar as autoridade e levar os
corpos para o vilarejo, o velório foi simples e com pouca gente, mas o que me
marcou mesmo foi o sermão do vigário que dizia assim.
A arrogância aniquila toda
sabedoria.... A ganância aniquila toda sabedoria.... O desprezo aniquila toda
sabedoria.... A soberba aniquila toda sabedoria...Porque sábio é aquele que entende que somente a humildade e o bom senso
são capazes de sustentar o peso do conhecimento.
Na
hora eu não entendi o porquê disso, mas depois de um bom tempo fui entender o
porque do vigário ter falado daquela forma, fiquei sabendo que ele por ser um
amante das caçadas e das pescadas, tinha sido uma vitima da dupla de oportunista
que além de tirar vantagem dele ainda o humilharam por muitas vezes, se aproveitando
da sua paixão pela caça.
Muitas
vezes o fizeram pagar toda a despesa, e depois o colocavam na pior espera, usavam
e abusavam das suas posses, vendiam apetrechos a preço de ouro e por se acharem os donos da razão sempre o
tratava com total desprezo.
Moral
da história...Ser humilde é a maior demonstração de sabedoria pois quem muito
quer...Nada tem...
Bello
30/05/2014.
A VISAGEM
Era uma manhã de sábado quando decidi
passar a noite em uma área isolada da fazenda, uma velha chacará abandonada,
onde tinham algumas mangueiras antigas cercada por uma cadeia de serras de mata
fechada e cortada pelo rio Tocantinzinho, após o almoço, uma bela leitoa assada
no fogão de lenha, tirei um bom cochilo, uma pestana pra carregar as baterias
como dizem por ai, mas lá pras duas da tarde já estava ajeitando a mochila para
pegar o trecho...
O sol forte se contrastava com o
horizonte nublado que anunciava chuva, mas como as nuvens estavam meio
bandoleiras e o vento agoniando as formações no céu, penseii que era apenas barulho
do tempo, apesar da lavoura pedir água, chuva boa mesmo já tinha uns 10 dias
que não caia naqueles sertões do Goiás.
Dona Ana já tinha coado o café e
ajeitado a marmita com uma boa farofa de carne de sol, dois sanduíches com
carne ao molho e umas frutas, a idéia era passar a noite, então era melhor
estar prevenido, capa de chuva e uma lona impermeável para armar acima da rede,
melhor prevenir do que remediar, lanterna, pilha reserva, repelente e uma roupa
de frio, ao lado da mochila a velha companheira CZ .22LR, com dez castanhas CCÏ,
e perna pra quem te quero.....rumo ao destino...
O velho companheiro Genaro ainda pegou
uma carona ate a divisa da lavoura onde ia passar o fim de tarde na espera de
cotia, num capão a beira da lavoura, no caminho ainda tentei convencê-lo de
passar a noite lá nas mangueiras comigo, mas ele num redou o pé...
_Vamo Home, vai ser aventura....
_Não muito obrigado fico com minhas
cotias, ocê vai, num tem erro não, dispois do colchete é só beirar a lavoura
dois quilômetros depois vai dar no colchete que tem uma tira branca que entra
pro cerrado, dipois a estrada acaba a 100 metros da beira do rio, vai bater uns
20 quilômetros da casa até lá...
E fechou a cara ajeitando o cigarro de
paia, pra quebrar o clima pedi que fizesse um palheiro pra mim, e ele oiou
serrado, esticando a mão com o cigarro enrolado a ponto de só passar a saliva e
prender a palha...Pega esse..... Chegando a beira do primeiro colchete já dava
pra avistar a lavoura de milho que brotava confundindo a cor vermelha da terra
com o verde da vida, parei o carro, desliguei o motor e desci, Genaro abriu a
porta calado, e desceu do carro separando sua traia e acomodando a beira da
estrada.
Pitando seu cigarro de palha apenas
acenou e me desejou boa sorte..
Segui a estrada, o sol se fazia forte
no céu, a lavoura verde circulava a estrada junto ao velho curral onde um casal
de seriemas fazia a farra, não tive dificuldades, logo chequei no primeiro
colchete e seguindo a estrada no segundo com a tira branca, entrada do cerradão,
seguindo a estrada esburacada de pouco
uso, avistei a serra lá embaixo, já podia ver a mata fechada cobrindo os montes,
e no meio de tanto verde o velho rio Tocantinzinho galopando as pedras em busca
do seu caminho.
Logo a estrada acabava em uma mata fechada
que o sol fazia força para entrar, porem era impedido pela copa frondosa e
cheia das grandes arvores, parei desci a traia, abri o porta malas e procurei na bolsa térmica um refrigerante
gelado para aliviar o calor, joguei a mochila nas costas e por um trieiro raso
marcado pela andança das antas segui até a beira do rio, lá uma velha ponte
caída tinha a muito tempo virado comida de cupim, então tive que entrar na água
e atravessar, tirei a roupa coloquei em saco plástico e fui molhar o corpo, ao
chegar do outro lado aproveitei para tomar um bom banho e me refrescar do
escaldante calor da mata, já vestido e pronto, segui trieiro a fora, e
continuei a caminhada passei por uma velha tapera desabada, no chão algumas
ferramentas e panelas, tudo velh e amassado, e tomado pela ferrugem, vestígio
de um antigo morador, cortei o capinzal e logo chequei a velha mangueira, o
chão repleto de sementes roídas de paca e cotia, trieiro vinha de todo lado da
mata , abaixo o rio corria forte enchendo a mata com o ronco da correnteza, o
que me atrapalharia demais escutar o romper da bicharada durante a madrugada.
Tirei a mochila pesada das costas,
apoiei a arma na mangueira, retirei o boné com a ponta do facão juntei tudo que era manga
em dois pontos que estavam ao alcance do tiro, conferi as entradas, tinha trieiro vindo de todo lado, chega tava fundo
do vai e vem da bicharada, caroço roído sem castanha amontoado pelos cantos
denunciava a festança das pacas no romper da noite, outros espalhados pelas
cotias se faziam bandoleiros um cá outro lá, pendurado pelo talo muitas mangas
comidas pelos periquitos e pássaros, então sorrindo pensei....A noite vai se
movimentada...
Subi ajeitei a rede, pendurei tudo, já
sentado a rede, armei a velha CZ, estava molhado de suor, tratei de tirar a
camisa me enxugar e vestir uma outra seca, fiz uma boca de pito com um
cafezinho que Dona Ana passou pra mim e acendi um palheiro, fiquei ali
contemplando a mata fechada que subia a serra, embalada pela cantoria dos
passáros, de longe um mutum piava fino como que avisando...Esse território é
meu.
O sol já ia longe e nada das cotias
chegarem, o relógio batia 18:15, e até o momento nem periquito passou para
beliscar as apetitosas mangas que pintavam de amarelo avermelhado o verde da
mangueira, fiquei meio cismado, e aos poucos a noite veio chegando, ainda era
20:30 e ainda não tinha escurecido, resolvi tirar uma pestana e me preparar
para longa noite que estava por vir, o céu estava limpo, algumas nuvens negras
fitavam longe no horizonte, mas eu tinha certeza que vinha chuva na madrugada.
Quando despertei já estava escuro, me
ajeitei na rede e fiquei atento, buscando de longe os pequenos ruídos da mata,
o silencio somente era quebrado pelo roncar da corredeira que ecoava mata a
dentro, e assim se fez até a meia noite, já desconsolado na certeza de que nada
ia vir, fiquei matutando o que poderia estar acontecendo, de certo alguma onça
deve ter beirado a mangueira espantando os outros animais.
De repente ao longe avistei uma luz
azulada, que parecia uma lanterna grande de led, mas ou menos no rumo dos
escombros da velha tapera caída, beirando o pequeno trieiro, fiquei olhando, e
essa luz veio em minha direção, lentamente como que uma pessoa caminhando com
uma lanterna, imaginei ser o velho Genaro, então me ajeitei na rede e me
coloquei a observar, e a luz veio clareando o capinzal até beirar a mangueira,
nesse momento já clareava ate minha mochila pendurada nos galhos.
Sem entender direito e meio atônico,
chamei pelo nome do companheiro...
Genaro, é você....E nada de
resposta...
De repente a luz se apagou, cismado
empunhei minha lanterna e iluminei tudo ao redor..Nada... Não tinha ninguém,
nesse momento uma enorme ventania entrou na mata fazendo regaço e balançando tudo,
chacoalhava as arvores cantando feito assovio por entre as folhas, o céu
escureceu escondendo as estrelas, e de longe escutei o romper da chuva ecoando
na copa das arvores.
De repente ....
Pooooooooooooooooooooooooooooooooooou...Um
disparo, a velha CZ disparou sozinha, quase me matando de susto, coisa que ao
longo de 18 anos na minha mão nunca tinha acontecido, fiquei sem entender,
acendi a lanterna e conferi a arma, meu Deus...
Não tive muito tempo para pensar, pois
a chuva vinha forte e mais que depressa tirei da mochila o telhadinho de lona
de guarda chuva e estiquei em cima da rede, com um saco plástico grande protegi
a mochila, e coloquei a velha CZ, embaixo da lona, foi só o prazo, e a chuva
chegou, um temporal repleto de raios e relâmpagos, ainda deu prazo para um café
e um pito, e o mundo desabou em água....Fiquei ali perdido em meus pensamentos,
preocupado com a chuva, os raios e a luz azul que cortou o capinzal, e por
ultimo a arma disparar sozinha, muito estranho.
E nesse vendaval de pensamentos adormeci, quando
despertei ainda chovia e o dia vinha desmanchando a barra da noite com
pinceladas de cor amarela mesclando com o laranja e o vermelho, alguns pássaros
ensaiavam o canto encorujados pelas penas molhadas esperando para se aquecer ao
sol, nesse momento já comecei a arrumar a traia, tirei a lona, dobrei, ajeitei
a mochila, desamarrei a rede ensaquei, e desci.
O pensamento ainda batia no acontecido
da noite passada, e a cabeça buscava uma explicação, fui até o local que a luz
parou, tentando achar uma pegada ou rastro de algo, ao remexer o capim uma
velha cruz caída e já consumida pelo tempo anunciava uma velha sepultura, algumas
letras que sobraram na velha cruz indicavam o nome do falecido, senti um enorme
arrepio, mas uma sensação de paz...
Baixei a mochila no chão, e ali me
ajoelhei e fiz uma prece, pedi a Deus que abençoasse aquela alma, que desse a
ela descanso, e após uma longa oração ainda roguei um Pai Nosso e uma Ave
Maria, me levantei e fiz trieiro rumo ao rio, as águas corriam claras
acompanhada da neblina da manha, atravessei devagar com a traia no lombo e logo
estava no carro de roupa trocada, subindo a serra..
Chegando na sede, pequei o café da
manha quentinho na mesa e durante a comilança, contei o acontecido ao velho
amigo que no meio de muita gargalhada me contou sobre o caso do velho morador
daquele lugar, um homem simples e bom, que foi assassinado por seu melhor amigo
por conta de uma divida banal e enterrado por lá mesmo pelas mãos do assassino,
era um velhinho batuta, baixinho, bem branco de olhos azuis, e que detestava a
presença de caçadores, chamava os bichos da mata de meus bichinhos.
Uma coisa eu tenho certeza, que
explicação pro ocorrido pode até ter, a luz não sei o que dizer, mas a arma
disparar pode ter sido obra de um camundongo desses que sobem na arvore que
pisou no gatilho doce e a fez disparar, agora a luz parar justamente na
sepultura do velho morador do lugar é realmente de encabular, se foi ilusão. ou,
se foi real, eu não sei dizer, mas que Deus tenha a alma daquele velho homem
que teve a vida ceifada por um falso amigo, e que se a alma dele cuida da
bicharada daquelas matas, que seja assim, eu com certeza tão cedo não volto por
lá, porque segundo meu amigo Genaro...
É lugar de visagemmmmmmmmmmmmm.....
Bello 19/09/12
Belo causo, meu véio. Sabe, cumpadi, todo esperador, chega um dia acaba dando de frente com uma visagem dessas. Um amigo meu esperador, esperando na boca da mata, de frente uma roça de milho já derrubado e ajuntado no meio dela, uma vez viu uma luz alaranjada vir e pairar em cima dos milho ajuntado e subia e descia, subia e descia, até subir na maior velocidade do mundo. Num carece dizer que ele arrumou a traia e cascou de volta pra sede da fazenda....rsrsrsrsrs....
ResponderEliminarÉ Belo, ocê demora escrever, mas quando escreve... É um trem de encher o zóio de água!!!!
ResponderEliminarSina de Mateiro é simplesmente o causo perfeito!!!
Muito bom teus causos, é de encher os olho que tenha gente que preserva nossa cultura caipira e nosso costume de contar causo. Abracos!
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